Os gostos da minha memória

by - segunda-feira, dezembro 05, 2016

A promessa de fazer posts relacionados a Gastronomia foi lançada e nada. Já estou terminando o 2º semestre e nada... Pois então, minha professora de Contexto Histórico e Cultural, grande sora Deise, lançou um trabalho que consistia em relembrar receitas de família, que lembravam nossa infância e relatar. Quem disse que isso foi fácil? Minha mãe não costumava cozinhar na floricultura que ela tinha quando eu era pequena. Não temos um caderno de receita herdado de minha vó. Não, nada disso. 
Consequentemente, não fiz o trabalho. Nada que a sombra do grau C não resolva. Corri para fazer e... o que eu ia escrever???Até que me veio. Fiquem com o resultado.
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Memórias Parnanguaras
Entre muitas experiências gastronômicas que tive em minha vida, posso afirmar que a maioria delas, ou pelo menos as que marcam a memória com uma pitada de nostalgia foram as que vivi no Paraná.

Por 9 anos de minha vida morei na cidade mais antiga do estado. Litorânea, mas sem praia. Pequena, mas movimentada. Lembro-me até hoje dos meios fios das ruas cobertas com grãos de sojas e do cheiro forte inesquecível.

Ainda no processo de mudança, deixando a terra gaúcha e chegando em solo paranaense, por poucos meses morei com minha vó Nadir em sua casa na cidade de Matinhos. Minha vó não era uma senhora muito aberta, mas muito elegante ao se arrumar todo dia. Fazía-me dormir cedo afim de acordar tão cedo quanto, nem que fosse para pegar no sono na sala ao som de desenhos animados. Daquela casa de 4 cômodos, me lembro do filtro de barro, antigo, que nunca soube repor a água, da grande quantidade de cupins que assoprava no chão para subir em cima da cômoda afim de olhar pela janela e das incontáveis horas que passei ouvindo as fitas K7 de Sandy e Jr.

Não me recordo de grandes banquetes, com diferenciados doces e de assistir por horas minha vó sovando pão na cozinha. Dessas memórias não compartilho. Econômica que era, voltava do mercado com um pacote de Rufles na sacola e com a promessa de nunca mais comprar, caso eu devorasse de uma só vez. A solução que ela via era quebrar a quantidade desejada em cima de um nissin miojo muito bem preparado e guardar o resto para a próxima refeição. Fui feliz. Vó Nadir nunca mais cozinhou para mim novamente.

Após a mudança definitiva, lá estava eu em terra de ‘sámenina’ e ‘semitidando’, crescendo ao som de ‘você’ e comendo feijão mulatinho.

Paranaguá tem muitas histórias e muitas coisas boas a ensinar áqueles que sabem ouvir e é com grande dor no coração que digo que não fui uma dessas pessoas. Crianças boas apreciadoras são raras.

O prato mais típico, que ganhou uma música em sua homenagem, é o Barreado. Sua preparação é fantástica, carne bovina muito bem temperada levada a panelas de barro pesadíssimas, tampadas e cozidas em alta temperatura por geralmente 15 horas, até seu total desmanche. Dizem que antigamente esse processo era feito em buracos na terra, durante festas e apresentações de Fandango. A montagem deixa mais claro a origem de seu nome. Prato fundo com camada de farinha de mandioca, com a carne e caldo por cima, onde esmaga-se com o garfo e pode ser servido com rodelas de banana. Refeição pesada, mas igualmente satisfatória.

Confesso que pouco comi o Barreado, mas experimentei sempre que possível. Já as balas de banana que vendia no mercado público eram tão comuns quanto as idas diárias a pé ao centro da cidade. Ser adolescente em cidade pequena é ir a todo lado sem preocupações, correr sem olhar para os lados e gastar cada centavo adquirido em coisas para comer. Fim de semana no lotado mercado público envolvia muitas porções de iscas peixe empanado, batata frita, regados com refrigerante e eventuais caldos de cana. Outra coisa bem típica da cidade e muito difícil aqui no sul, caldo de cana. Encontrar uma barraquinha que moa a cana na hora era tão fácil lá e tão difícil aqui que ao ser avistado é lei parar e tomar um copo. Seja ele puro, com limão ou abacaxi.

Ter coração parnaguara é trazer uma cultura completamente diferente, mas tão rica quanto a gaúcha. Essa troca de sabores e de ingredientes que encontrei lá permanece no meu caminho enquanto caminho por ele.

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